Professoras da USP negam criação de reserva de mercado com o PL 334/2013

Profª Eve Betine e Profª Rosa Chubaci, da USP- Universidade de São Paulo.
Profª Eve Betine e Profª Rosa Chubaci, da USP- Universidade de São Paulo.
Profª Eva Bettine e Profª Rosa Chubaci, da USP- Universidade de SP.

O Brasil está envelhecendo rapidamente. Em poucos anos seremos o sexto país mais envelhecido do mundo. Em 2030 teremos mais idosos que adolescentes em São Paulo, a cidade mais populosa do Brasil. Em 2050 teremos cerca de 68 milhões de idosos em nossa nação.

Essas afirmações que já se tornaram repetitivas para quem estuda e trabalha com a área do envelhecimento parecem ainda distantes do grande público e ainda não soaram o suficiente para a sociedade brasileira. Não o bastante para entender as grandes modificações que já são necessárias serem construídas. Muitas já com anos de atraso.

Talvez, por isso, as campanhas contra violência à pessoa idosa tenham sido tão mal divulgadas, na semana passada quando se lembrou em mais de 100 países, o Dia Mundial de Combate à Violência Contra Pessoa Idosa. Talvez, por isso, os debates sobre as alterações que o Congresso Nacional está gestando para a Previdência fique parecendo assunto só de sindicatos e grupos politizados. Talvez, por isso, também, a maioria não esteja se dando conta que todos os assuntos que dizem respeito ao envelhecimento deveriam interessar todas as pessoas.

Nos bastidores dos estudiosos do envelhecimento, no entanto, as coisas andam mais agitadas e uma polêmica que estava reservada as coxias acadêmicas ganhou publicidade na semana passada, quando o Jornal da 3ª Idade , publicou a entrevista da Profª Tereza Rosa Lins Vieira, atual presidente da Associação Nacional de Gerontologia do Brasil – ANG Brasil- e membro do CNDI-Conselho Nacional dos Direitos do Idoso, que colocou sua crítica ao Projeto de Lei 334/2013, que está para ser voltado no Senado Federal e que foi originalmente organizado em São Paulo.

A professora alagoana se posicionou a favor da regulamentação da profissão de Gerontólogo, desde que ela não crie uma reserva de mercado para os bacharéis dos cursos recentemente criados em São Paulo, como ela entende estar embutido no texto do projeto de lei. (entrevista)

As professoras paulistas argumentam que não existe essa proposta e que a regulamentação não pretende restringir nem limitar a atuação de outros profissionais, que poderão independente da sua profissão de origem se especializar em Gerontologia.

O Jornal da 3ª Idade recebeu várias manifestações contrárias, aos dois lados.

As professoras da USP-Universidade de São Paulo, Eva Bettine (graduada em Gerontologia pela USP, mestre em Filosofia por Estudos Culturais, aluna especial de doutorado na USP e professora convidada da Each/USP) e Rosa Yuka Sato Chubaci (enfermeira de formação e coordenadora e professora do curso de bacharelado em Gerontologia e membro do Comitê de Ética da Escola de Artes e Ciências e Humanidades da USP) solicitaram uma conversa para esclarecer as dúvidas colocadas.

Do encontro que fizemos, num café na Avenida Paulista no último sábado, saiu essa entrevista exclusiva para o Jornal da 3ª Idade.

Jornal da 3ª Idade – A entrevista publicada na semana passada pelo Jornal da 3ª Idade, com a Profª Tereza Lins, presidente da ANG- Associação Nacional de Gerontologia abriu uma polêmica, com várias declarações públicas discordantes. Ela é categórica em afirmar que o texto 334/2013, como está colocado cria uma reserva de mercado para os profissionais formados em cursos recentes. As senhoras repudiam essa afirmação?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Nós consideramos essa preocupação extremamente equivocada. Antes de escrever o nosso projeto de lei, que hoje está para ser votado no Senado, nós consultamos os projetos de regulamentação de várias outras profissões e em todos eles existe o objetivo primordial de definir o perfil profissional e a atuação dele, a partir da sua graduação. É isso que nós estamos fazendo. A USP (Universidade de São Paulo) e a UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), que são as pioneiras nesse curso de graduação no país pesquisaram muito antes, para saber o espaço que esse profissional poderia ter no mercado. E a demanda está explodindo. O gerontólogo veio para preencher uma lacuna real do mercado.

Jornal da 3ª Idade – Quando e onde nasceu a proposta pela regulamentação da profissão de gerontólogo?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Toda profissão quando é criada espera-se que ela seja regulamentada. Essa é uma expectativa para todas as profissões, mas quando existe uma interface com a área da Saúde, essa exigência torna-se muito maior. E foi com essa preocupação que os graduados em Gerontologia da Universidade de São Paulo criaram uma associação- a ABG- Associação Brasileira de Gerontologia. Desde que os primeiros bacharéis em Gerontologia, da Universidade de São Paulo, se graduaram que a ABG vem organizando-os para que não fiquem dispersos pelo país, já que existem alunos de vários locais do Brasil. A ABG já foi criada tendo entre as suas finalidades trabalhar pela criação da regulamentação da profissão de Gerontólogo.

Jornal da 3ª Idade – Quando a ABG começou a trabalhar no texto que foi enviado ao Senado?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Um grupo de trabalho funcionou com esse propósito. No final de 2012 entramos com um projeto no Senado Federal e já no começo de 2013 ele ganhou um número oficial de projeto de lei, através do Senador Paulo Paim.

Jornal da 3ª Idade – Qual a situação desse projeto de lei 334/2013, no momento?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Ele está tramitando no Senado, passou diversas comissões, ganhou algumas emendas e no momento está em decisão terminativa na Comissão de Assuntos Sociais. O que existe é um equívoco da parte de algumas pessoas. Elas têm a sua graduação e seus respectivos conselhos, seja médico, assistente social, fonoaudióloga e outros. O nosso projeto está buscando criar a identidade profissional desse profissional que está formado ou se formando para ser um Gerontólogo. Temos hoje 580 profissionais formados, atuando no mercado nacional, usando seus conhecimentos, mas ainda sem a regulamentação profissional.

Jornal da 3ª Idade – As senhoras garantem que não será possível- se o PL 334/2013 for aprovado da maneira como está- que a lei venha a criar empecilhos de atuação junto aos idosos, de outros profissionais, que não tenham a graduação de Gerontólogo?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Não, esse impedimento não existe. Nós tivemos essa conversa com a presidente da Comissão de Assuntos Sociais, a Senadora Marta Suplicy e ela foi bem clara explicando que a partir do momento que foi tirada a palavra privativo, não se está excluindo ninguém. Foi com ela a nossa última conversa oficial sobre o assunto e nos sentimos esclarecidos.

Jornal da 3ª Idade – O PL334/2013 sendo aprovado no Senado vai para a Câmara Federal para novas rodadas de apreciação e votação. Existe algum outro texto que possa conflitar esse PL?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Existe um outro projeto na Câmara Federal, que foi colocado no ano passado, que é uma réplica do nosso que já está no Senado, com algumas questões a mais. Esse texto que está tramitando na Câmara coloca, logo no seu início que o gerontólogo é, além daquele, formado bacharel, os especialistas, os mestres, os doutores que se especializaram em Gerontologia. E nós não ficamos felizes com isso. O projeto de lei de regulamentação de uma profissão é colocado para normatizar uma graduação. Da mesma maneira que uma nutricionista, que já tem a sua lei e a sua regulamentação pode se especializar em Gerontologia, amanhã um gerontólogo também poderá se especializar em Nutrição, o que não vai torná-lo um nutricionista. Essa é a divergência entre o texto do Senado e o que está na Câmara Federal.

Jornal da 3ª Idade – Qual a definição que as senhoras professoras dão para gerontólogo?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Esse nosso gerontólogo é o profissional que vai ser gestor do envelhecimento. Ele vai fazer uma microgestão quando vai ajudar as pessoas a gerenciarem o seu processo de envelhecimento, ajudar as famílias a gerenciarem os seus idosos. O gerontólogo faz um trabalho de mesogestão quando vai atuar em instituições para idosos, como Centro Dia, ILPI e Centros de Convivência. Eles podem também fazer a macrogestão quando vão atuar com políticas públicas, ajudando a criar programas e ajudando a implementá-los, ajudar as cidades a se prepararem para o envelhecimento da população. Nosso curso não prepara pessoas para trabalhar diretamente com o idoso, nosso curso não é de cuidado, mas de gestão do envelhecimento. Esse gerontólogo vai fazer parte de uma equipe multiprofissional, ele nunca vai atuar sozinho.

Jornal da 3ª Idade – Quando começaram os cursos formadores de bacharéis em Gerontologia? Quais são as universidades que oferecem os cursos?

Profª Rosa Chubaci e Profª Eva Bettine– Na Universidade de São Paulo começou em 2005. Na Universidade Federal de São Carlos começou em 2009. Existem outras universidades que estão esperando a regulamentação para começarem a ofertar seus cursos de bacharelado em Gerontologia. A Federal do Rio Grande do Sul, a Federal de Mina Gerais, a Federal do Amazonas e a PUC de São Paulo que já tem um dos melhores cursos de mestrado em Gerontologia e que tem interesse no de bacharel. Temos muitos idosos no Brasil. Não vai faltar trabalho para ninguém.