Estreia amanhã, no circuito brasileiro de cinema, um filme que deve ser assistido por muitas pessoas, mas especialmente pelos que trabalham com idosos, pelos jovens que estão investindo na carreira da Gerontologia, por pessoas que estão começando a estudar o envelhecimento.
O filme A Última Lição, dirigido por Pascale Pouzadoux, baseado no livro francês de Noëlle Chatelet, que foi aclamado pela crítica francesa não é certamente um fenômeno cinematográfico- e nem é isso que importa- mas é um bom trabalho, daqueles que faz a gente sair sem rumo da sala do cinema.
O filme, sem mirabolantes efeitos especiais, com cenas muito comuns ao dia a dia de muitas famílias de classe média, faz rir, faz pensar em coisas que a gente vive adiando lembrar, faz chorar.
Pode até parecer estranho que um filme que gira em torno de uma mulher de 92 anos, que decide marcar a data de sua morte e toma todas as providências para que tudo se passe da melhor maneira, seja lançado agora.
O período do Natal é regido pelas mensagens de esperança, fé e amor à vida e falar no direito de escolher a forma de morrer parece não ser adequado ao momento.
Mas é sim. A Última Lição oferece com essa discussão a possibilidade de se observar que existem várias formas de renascimento, principalmente das relações desgastadas, que existem na maioria das famílias e que costumam vir à tona, nessas confraternizações.
Na ficção a gente assiste Madeleine aproveitar a comemoração do seu nonagésimo segundo aniversário para comunicar a família que decidiu que está na hora de “partir”. Ela exige que os filhos, genro, nora e netos entendam que essa já era uma decisão tomada há muito tempo, que já tinha sido comunicada antes e que por isso não deve ser motivo de lamentações. Sua filha Diane respeita a escolha da mãe e divide com ela o humor e a cumplicidade desses últimos momentos. O filho “enlouquece”.
As mudanças que passam a ocorrer na rotina da família é que valem o filme. Será impossível para quem convive com idosos ser apenas expectador e – em algum momento- não se sentir dentro de algumas cenas.
Inspirado em fatos reais
O filme é inspirado em fatos reais que aconteceram com a mãe da autora a filósofa Noëlle Châtelet, que também é irmã do ex-primeiro ministro francês Lionel Jospin. Mireille Jospin se suicidou no dia 6 de dezembro de 2002, aos 92 anos. Obstetra aposentada, ela escolheu por fim à sua vida com muita consciência, para se manter fiel a alguns princípios de vida e de morte. Três meses antes do Dia D, ela anunciou sua decisão à família. O caso deu origem ao livro “A Última Lição”, lançado pela Ed. Seuil em 2005.
Nesta narrativa autobiográfica, a autora conta os três últimos meses de sua mãe de forma bastante honesta, longe da tristeza, pelo contrário, recheado de gargalhadas e momentos de muita intimidade. O livro também é uma declaração de amor a uma mãe extraordinária.
Família de primeiro mundo
O foco do direito a eutanásia- que foi o que motivou a escritora e o diretor do filme a executarem seus trabalhos- fica bastante diluído nas várias questões do envelhecimento da matriarca.
Vários outros debates aparecem: o direito de a pessoa idosa viver ou não sozinha na sua casa; como saber se a institucionalização é a melhor opção; o direito a conviver com utensílios antigos e fora de moda, mas que são importantes nas suas lembranças; quando os filhos devem tomar as decisões pelos pais.
A família que aparece no filme vive todos esses dilemas universais dos idosos, mas está longe das demais necessidades das famílias mais pobres. A senhora que exige o seu direito de escolher o modo de morrer, tem garantido como a maioria dos idosos europeus o direito a viver com dignidade.
No filme a família tem médico e um bom consultório à disposição para discutir a sanidade da idosa e têm o seguro saúde em dia, que pode ser acionado pelo telefone em segundos. Mora num apartamento digno, daqueles mais baratos para idosos sem elevador, mas com um bom serviço de aquecedor.
Direção: Pascale Pouzadoux
Roteiro: Pascale Pouzadoux, Laurent de Bartillat
Elenco: Marthe Villalonga, Sandrine Bonnaire, Antoine Duléry
País: França
Ano: 2015
Gênero: Drama Duração: 1h 45min Classificação etária: 14 Anos Lançamento: 22 de dezembro de 2016 (Brasil)